PrEP: Escolhas
Antes de convidar Valdiléa Veloso para falar acerca da PrEP sob demanda, o gerente do projeto ImPrEP, Marcos Benedetti, levantou uma questão a ser refletida por todos os participantes: qual o nome a ser adotado para esse novo esquema da profilaxia no sentido de melhor divulgá-lo junto às populações-chave? PrEP sob demanda, PrEP Eventual, PrEP 2+1+1? Colocou ser esse também um desafio a ser vencido na possível prorrogação do projeto.
Valdiléa ratificou a importância da prorrogação do projeto ImPrEP não só para um melhor e mais adequado monitoramento e formatação dos resultados da implementação da PrEP no Brasil, Peru e México, mas como uma oportunidade de fornecer subsídios concretos sobre a oferta da PrEP sob demanda – no Brasil, a experiência foi uma solicitação direta do Ministério da Saúde ao ImPrEP.
A pesquisadora principal informou sobre a gama variada de opções que vêm sendo construídas no universo da PrEP, fazendo uma analogia com o surgimento da pílula anticoncepcional e seus consequentes e diversos desdobramentos em termos de prevenção e possibilidades de escolhas para as mulheres.
Comentou sobre os estudos iprex e Ipergay, dedicados à PrEP diária e à PrEP sob demanda, com controle inicial de placebo seguido de estudo observacional. Destacou o Ipergay e a comprovação da eficácia no esquema da PrEP sob demanda para gays e outros HSHs que apresentam uma vida sexual menos frequente e que conseguem organizá-la com mais facilidade, por meio da ingestão de dois comprimidos ao mesmo tempo de 2 a 24 horas antes da relação sexual, mais um comprimido 24 horas após a primeira dose e um outro 48 horas após a dose inicial.
Valdiléa abordou também o estudo Prevenir, voltado a aprofundar não só conhecimento da PrEP sob demanda, como também a expandir o uso da PrEP em toda a França e reduzir em 15% os novos diagnósticos em HIV em Paris, por meio da oferta dos dois esquemas como alternativas à população em 2016. Os resultados comprovaram a boa aceitação, o baixo índice de novos casos de HIV e uma clara demonstração do uso do esquema diário para quem tem práticas sexuais mais frequentes e a PrEP sob demanda para quem apresenta menor regularidade e maior capacidade de programar suas relações sexuais.
O estudo ofereceu, ainda, dados comparativos entre o esquema diário e a PrEP sob demanda, não apontando diferenças significativas em termos de efeitos adversos ou alterações da função hepática. O Prevenir calcula ter evitado 143 novas infecções num universo de cerca de 3 mil participantes. Esse cálculo específico também será feito pelo projeto ImPrEP.
Com base nesses resultados, a OMS recomendou a PrEP sob demanda como uma das alternativas à prevenção do HIV, reforçando que os estudos debruçaram-se apenas sobre a população gays/HSH, não sendo indicado atualmente para mulheres cis e trans, homens trans que praticam sexo vaginal/frontal, homens que praticam sexo vaginal ou anal com mulheres e pessoas com hepatite B crônica. Quanto à população trans, é preciso ter mais evidências científicas, em especial acerca dos hormônios, para que possa ser recomendada para uso por essa população.
Esclareceu que o ImPrEP não foi desenhado para fornecer resultados específicos sobre a relação população trans/PrEP sob demanda, o que exigiria estratégias e recursos específicos. Informou que o projeto se debruçará sobre a questão da PrEP eventual no sentido de conhecer o pensamento/conhecimento das pessoas, inclusive trans. Entretanto, lembrou que o ImPrEP também colaborará na construção de evidências para essa população por meio de estudos para avaliar a relação do nível do medicamento com os hormônios, cuja quantidade é muito diversa entre as usuárias.
Valdiléa lembrou também que, a partir dos estudos, uma das recomendações de alteração a ser proposta pelo ImPrEP ao Protocolo PrEP, será iniciar ou reiniciar a profilaxia com dois comprimidos, evitando a espera de sete dias para garantir a proteção mínima em termos de efeito do medicamento no organismo.
De acordo com a pesquisadora, muita coisa ainda surgirá em termos de PrEP, e o próprio ImPrEP, até o seu final, gerará evidências como, por exemplo, a respeito da forma como as populações-chave do projeto se comportaram em relação ao uso da profilaxia, se houve perda de vínculos, a questão do risco aumentado em razão da demora de diagnóstico de uma IST, soroconversão ao HIV, entre outras.
Frisou a importância de usar o discurso correto, no sentido de mostrar que a implementação da PrEP em estudos de demonstração, como o ImPrEP, não só evita o HIV mas também aponta a presença de ISTs a serem tratadas. De qualquer forma, levantou a necessidade de novos recursos para maior investigação a respeito dessas infecções no Brasil.