A importância da liderança comunitária no enfrentamento ao HIV/aids
O “Ending AIDS by 2030”, que pode ser traduzido como “Acabar com a aids como problema de saúde publica até 2030”, é uma meta global estabelecida pela comunidade internacional para combater e controlar a epidemia de HIV que integra os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. A par de todos os esforços científicos e financeiros que vêm sendo empreendidos, um pilar para alcançar essa meta é, sem dúvida, a atuação dos líderes comunitários que, por meio de ações e discursos assertivos, desenvolvem um trabalho fundamental junto às populações que representam.
“O mundo pode acabar com a aids, contando as comunidades para liderar o caminho”. Não à-toa, essa foi a mensagem escolhida pelo Unaids, programa das Nações Unidas criado em 1996 e que tem a função de criar soluções e ajudar nas ações no combate à epidemia de HIV, para marcar o Dia Mundial de Luta contra a Aids do ano passado.
A mensagem busca reforçar os importantes laços dos líderes que atuam no campo do HIV/aids com as comunidades, conectando serviços de saúde pública com as pessoas, colocando-as no centro das discussões, construindo confiança, inovando, monitorando a implementação de políticas e serviços, e responsabilizando os setores provedores.
O projeto ImPrEP CAB Brasil tem, na educação comunitária, um dos seus mais importantes componentes de atuação, por meio das iniciativas implementadas pelos educadores e educadoras de pares junto às populações-alvo visando a trazer informação, avivar pontos e necessidades apontadas, dar o suporte possível e, mais do que tudo, ser o porta-voz dessas comunidades e o elo com as instâncias de pesquisa e, em muitos casos, com as esferas governamentais locais.
Líderes comunitários ImPrEP
E o que será que esses líderes comunitários do ImPrEP CAB Brasil pensam sobre o trabalho que desenvolvem e o que têm a dizer sobre as tecnologias atualmente disponíveis em termos de prevenção combinada, como a profilaxia pré-exposição (PrEP) ao HIV?
"No início dos anos 2000, comecei a atuar como educador de par para a prevenção ao HIV/aids entre a população LGBTI+, o que me possibilitou ter contato com a pesquisa científica. Fui uma das primeiras pessoas a se beneficiar com a PrEP no Brasil, quando sua eficácia ainda era estudada. Hoje, utilizo da minha experiência pessoal, como usuário, para mobilizar a minha comunidade. A PrEP, a profilaxia pós-exposição (PEP) e outras ferramentas da prevenção combinada precisam estar difundidas e no cotidiano dos jovens e de toda população mais vulnerabilizada à epidemia do HIV/aids". Julio Moreira, coordenador comunitário do ImPrEP CAB Brasil para a população HSH e diretor sociocultural do Grupo Arco-Íris.
“Participo de projetos de prevenção ao HIV desde 1991, quando ainda não existiam as pesquisas, estudos e tecnologias de hoje. Importante destacar que a formação de pares é crucial para o enfrentamento do HIV/aids, sendo fundamental o incentivo federal para os movimentos sociais executarem atividades na ponta. Precisamos falar e muito sobre aids, posto que a população trans ainda é uma das que têm altos índices de incidência do HIV. É urgente popularizar novamente a prevenção por meio de ações, políticas e amplas campanhas sobre PrEP e PEP, em especial para a população mais jovem”. Keila Simpson, coordenadora comunitária do ImPrEP CAB Brasil para a população trans e presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais.
Amazonas
O trabalho de educação de pares contribui para levar informação sobre a prevenção combinada do HIV e de outras infecções sexualmente transmissíveis (IST) de maneira simplificada para dentro das comunidades em que atuamos. Utilizamos uma linguagem popular, humanizada e livre de julgamentos para que mais pessoas das populações-chave procurem PrEP no nosso centro e criem um vínculo de confiança no trabalho de prevenção e acolhimento, tornando a nossa atuação uma referência para que outras pessoas sintam-se à vontade para conhecer sobre a estratégia de prevenção combinada do HIV. Gabriel Mota e Maya Freitas, educadores de pares do ImPrEP em Manaus (Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado)
Bahia
O trabalho como educadores de pares para a comunidade é especialmente importante entre jovens, pois é por meio de uma linguagem muito própria da juventude que podemos comunicar, desenvolver e multiplicar saberes sobre prevenção e saúde coletiva. Discutir prevenção entre jovens é algo de extrema importância para a valorização da vida e para contribuir com o exercício de uma sexualidade mais livre e com conhecimentos para fazer escolhas seguras. Acreditamos que esse trabalho como educadores de pares contribui coletivamente com concepções e informações que nossas comunidades minoritárias têm carência. Temos o compromisso de nos inserir nessas comunidades e, assim, contribuir com o desenvolvimento social. Bruna Fonseca e Uilian Ferreira de Jesus, educadores de pares do ImPrEP em Salvador (Centro Especializado em Diagnóstico, Assistência e Pesquisa)
Rio de Janeiro
Como educadores de pares fazemos a ponte para a sinergia do conhecimento científico, levando informações sobre as novas tecnologias e estudos clínicos em prevenção, no combate ao HIV/aids, para pessoas com maior índice de vulnerabilidades, como comunidades, locais de profissionais do sexo, saunas, vias públicas, ONGs, associações de moradores etc. Promovemos e fortificamos o acesso aos serviços e cuidados oferecidos pelo SUS, garantimos o pertencimento e beneficiamos populações em vulnerabilidade. Além disso, propiciamos o voluntariado para a promoção da erradicação do HIV/aids por meio de políticas públicas pautadas em pesquisas clínicas. Laylla Monteiro e Toni Araújo, educadores de pares do ImPrEP no Rio de Janeiro (Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz)
Percebo que as vidas das pessoas que recrutei mudaram muito. Antes, algumas pessoas não tinham informações sobre prevenção ao HIV/aids e, depois de passar por uma educadora de pares, começaram a reduzir as suas exposições às IST e ao sexo sem camisinha, e passaram a multiplicar informações para as suas amigas a fazerem o mesmo. Salvar vidas de possíveis infecções é uma vitória, e isso é muito significativo. Biancka Fernandes, educadora de pares do ImPrEP no Rio de Janeiro (Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz)
Santa Catarina
Como educadores de pares, vemos que nossa maior contribuição é a garantia do direito ao acesso à informação sobre prevenção combinada de IST/HIV. Mais especificamente na comunidade de Florianópolis, vemos que há muitas pessoas com dúvidas com relação à PrEP e PEP ou que nem sabiam da existência desses medicamentos. Logo, com as ações feitas, conseguimos ampliar a conscientização da população sobre prevenção e a ampliação de usuários de PrEP. Matheus De Luca e Oliê Cárdenas, educadores de pares do ImPrEP em Florianópolis (Centro de Testagem e Aconselhamento – Policlínica)
São Paulo
Atuo, como educadora de pares, na promoção do acesso à educação em prevenção combinada entre pessoas LGBTQIPN+ de Campinas e região em diferentes níveis de impacto que garantam em suas especificidades a mobilização entre essas populações afetadas desproporcionalmente pela epidemia de HIV/aids. Campinas é a cidade onde fica o maior serviço em HIV/aids, IST e Hepatites Virais do interior paulista. Com uma histórica e exemplar resposta à epidemia no país, a cidade possui uma comunidade engajada em direitos humanos e no acesso à saúde de populações vulnerabilizadas. Erikka Faustino, educadora de pares do ImPrEP em Campinas (Centro de Referência Municipal em IST, HIV/Aids e Hepatites Virais)
Como educador negro em um centro de referência LGBT dedicado ao combate às IST/aids, vejo meu papel como uma oportunidade de impactar positivamente as comunidades que servimos. Minha experiência pessoal e profissional me permite transmitir conhecimentos cruciais sobre métodos de prevenção e cuidados de saúde. Acredito firmemente ser fundamental que todos tenham acesso a informações precisas e inclusivas sobre saúde sexual. Ao compartilhar meu conhecimento, espero capacitar e proteger aqueles que muitas vezes são marginalizados ou negligenciados. Juntos, podemos trabalhar para construir comunidades mais saudáveis e resilientes, onde todos tenham acesso a cuidados de saúde de qualidade e apoio mútuo. Marcelo Siqueira, educador de pares do ImPrEP em Campinas (Centro de Referência Municipal em IST, HIV/Aids e Hepatites Virais)
Como educadora de pares e mulher trans, percebo o quanto isso me aproxima das meninas trans e travestis que atendo todos os dias. É notável nos atendimentos o quanto se sentem à vontade para falar de suas intimidades por estar frente a outra pessoa que é sensível ao tema e não só por empatia ou ética profissional, mas por vivenciar também muitas dessas dores e compartilhar e vibrar por cada conquista alcançada. Cecilia Aset, educadora de pares do ImPrEP em São Paulo (Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids)
Como principal contribuição, a informação é o principal aliado para aproximar e facilitar o acesso a novas tecnologias de prevenção ao HIV, preferencialmente para as populações mais vulneráveis em termos socioeconômicos. Criar vínculos também julgo ser de grande importância para reter a assiduidade nesse tipo de cuidado. José Robson, educador de pares do ImPrEP em São Paulo (Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids)